A Era do Ferro: Memória e Patrimônio
Armando Sobral, curador do projeto A Era do Ferro no Pará
Em 12 de janeiro de 2016 Belém completará 400 anos, a data é significativa para todos nós; como as velhas mangueiras que nos protegem do sol, Belém nos acolhe, é a nossa morada. Este lugar foi erguido com o suor das lutas, sonhos, mitos e fantasias, vividas e contadas por todos que aqui nasceram e criaram seus filhos, pessoas que desbravaram esta terra exuberante e deixaram um legado de quase quatro séculos de história reunidos em sua cultura, prédios e ruas. Hoje continuamos a saga iniciada por nossos antepassados e, assim como eles, queremos ver nossos descendentes crescerem felizes em um lugar onde possam se identificar e prosperar seguros. Contudo, pensar no futuro é respeitar e conhecer o passado, em outras palavras, preservar a nossa memória. Uma comunidade que não zela por sua memória e tradições perde as suas bases, desagrega-se e perece; não basta olharmos apenas para o que conquistamos ou possuímos, devemos cuidar do que é coletivo, isto é, ser cidadão. Os elos com a nossa cidade têm se tornado cada vez mais tênues a ponto de assistirmos impotentes esta velha Senhora ser desrespeitada com todas as formas de vandalismos e descaso, até por aqueles que tem a obrigação em mantê-la; ofensas injustificáveis contra esse Ente generoso que nos provém de tudo em abundância. Precisamos cuidar melhor da nossa querida Belém, levar a sua história para as novas gerações e reforçar neles os laços afetivos com a sua própria cidade, é a melhor maneira de preservá-la; antes que outros a reivindiquem e desfigurem o nosso passado – a propósito, não estamos muito longe disso.
Este projeto entende que o modo mais eficiente de resguardar a nossa memória é através da educação, visão que levou à elaboração de um programa ambicioso que conta com a publicação de milhares de maquetes de prédios históricos para serem montados pela população, laboratório com estudantes de arquitetura, palestras e exposições nas escolas públicas como maneira de conscientizar a sociedade acerca da importância em preservar nosso belo e peculiar patrimônio histórico arquitetônico.
A Era do Ferro no Pará revela Belém entre o fim do século XIX e começo do XX, quando se verifica o florescimento econômico da região e a ascensão de uma burguesia enriquecida com o comércio da borracha. Nessa época a capital sofreu as mais profundas transformações e foi remodelada segundo um ideal identificado com as modernizações ocorridas nas cidades européias, modificadas pela Revolução Industrial durante o século XIX. É quando belos parques e áreas verdes como a Praça de República e a Batista Campos surgem no cenário urbano de Belém e uma nova arquitetura feita totalmente de ferro trazida da Europa é erguida na Amazônia, hoje adotada como marcos visuais de grande valor simbólico e afetivo para o paraense: o Mercado de Peixe, o Relógio de Ferro, o Mercado de Carne, o reservatório de São Brás, os galpões do porto das Docas, dentre outros. As melhorias urbanas feitas no período como as reformas dos mercados públicos, alargamento de ruas e calçadas, rede de esgoto e abastecimento, urbanização de bairros, embelezamento de vias públicas e praças, reestruturou a cidade de tal forma que ainda hoje dependemos desses grande feitos. Realizações possíveis somente em uma sociedade com aguda visão de futuro, auto-estima inabalável e profundo sentimento de amor e cuidado por sua cidade.
Quando olhamos para nossa quadringentenária Belém, ainda hoje ameaçada por aqueles que ignoram nossos valores, sentimos uma certa melancolia pelas perdas irreparáveis de nosso patrimônio, como também por um benéfico sentimento de orgulho por pertencermos a uma cultura tão rica e de passado memorável, que, como foi dito anteriormente, deve ser contado aos nossos filhos e netos.
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